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Um satélite descarado

Aconteceu por telefone. Uma burlona convenceu dezenas de mulheres de S. Bartolomeu de Messines, no Algarve, a mostrarem os seios em locais públicos. Garantia-lhes que, do espaço, lhes faria uma mamografia. De borla. E, de binóculos em punho, gozava o espectáculo. Mas há dúvidas de que seja crime

Luís Ribeiro  / VISÃO nº 487    4 Jul. 2002

A história que J., 35 anos, tem para contar começa com um estranho telefonema para o restaurante onde trabalha. Eram 3 da tarde do dia 5 de Junho tinha já terminado a hora de servir almoços aos habituais clientes, quase todos trabalhadores da construção civil, de manga cava para arejar o suor debaixo dos braços. De auscultador na mão, ouve, com mais ou menos rigor, o seguinte palavreado: «Boa tarde, daqui fala a doutora X [J. não apanha o nome], sou médica numa clínica de Lisboa, e encontramo-nos a testar uma nova tecnologia. Está um satélite por cima de Messines, preparado para efectuar mamografias e gostaríamos de lhe pedir para ir à rua, ao lado do restaurante, e destapar o peito para nós captarmos as imagens e fazermos o exame.»

«Desculpe?!» Face ao desconfiado tom de voz de J., a «doutora» desbobina um pequeno discurso sobre o perigo do cancro da mama, divulga algumas estatísticas, repete que é uma experiência nova e avisa que o rastreio é feito sem compromisso «porque pode não resultar». Acrescenta que é gratuito. Depois disto, J. sente-se preparada para seguir, à risca, as instruções que lhe são transmitidas.

Primeiro: despir o soutien na casa de banho do restaurante. Segundo: dirigir-se à rua e virar-se para uma certa direcção. Terceiro: desabotoar os botões da camisa. Quarta: com o soutien pendurado numa mão – «para o satélite a sintonizar melhor» – espetar o peito de forma a que o sol lhe dê luz suficiente. J. fez tudo o que lhe mandaram, escondendo-se ocasionalmente, quando passava um carro ou alguém esbugalhava os olhos ao deparar-se com o panorama. Ao achar que o satélite já tinha tido tempo suficiente para fazer o seu trabalho, voltou para dentro.

De água na boca

A coisa não correu bem à primeira, dizem a J. cinco minutos depois, através de novo telefonema da suposta médica. Problemas técnicos obrigam a que lá volte, mas de soutien vestido – agora, teria de pôr cá fora uma mama de cada vez, apoiando com a mão e apertando o mamilo. Claro que o «sintonizador» continua a ser imprescindível, pelo que tem de ser uma colega, uma rapariga de 18 anos, a emprestar o respectivo suporte.

É aí que a «doutora» fica fascinada com o tamanho do novo soutien. «Desculpe, mas que número veste a sua colega? Não é o 44?» Não, era apenas o 40, mas o interesse não se desvanece por isso. «Ah, a rapariga também tem de fazer a mamografia, que tem as mamas muito grandes e pode ter algum problema.» E lá vão as duas, de peitos voltados para o sol e cabeças levantadas para o céu, a tentar descortinar o último grito em tecnologia, suspenso uns quilómetros acima da pacata vila de S. Bartolomeu de Messines.

Até que surge a patroa. Quando Maria, 45 anos, as vê naquele estado, fica de boca aberta. «Mas o que é que vocês estão a fazer?» Explicações dadas, regressam todas para dentro.

E o telefone toca outra vez. Agora, J. ouve uma voz alarmada: «Essa senhora que apareceu ao seu lado, de camisola verde, teve um problema grave e foi operada há pouco tempo. Vai ter de fazer o exame para ver se está tudo bem.» O problema que Maria efectivamente teve não tinha nada a ver com os seios, mas isso não era impedimento para um equipamento daqueles. Curiosa, a dona do restaurante entra na jogada. E acaba por ir ainda mais longe que as outras – às tantas, a pedido da «doutora», baixa mesmo as calças, de forma a que o alegado satélite espiolhasse a cicatriz da barriga.

«Não pensei que fosse uma coisa sexual»

Só por volta das nove da noite, depois de incontáveis excursões à rua, é que a história se revela. Mais uma vez, J. atende o telefone e, desconfiada, diz: «Ó doutora, estou a achar muito estranho tanto interesse pelas minhas maminhas...» Do outro lado, respondem-lhe: «Pois, para mim, foi uma tarde fabulosa. Inesquecível.» Acrescenta, por fim, que tinha estado a tarde toda a gozar o espectáculo com a ajuda de uns binóculos e que havia conseguido «vários orgasmos».

«Julguei tudo menos isto. Pensei que podiam estar a distrair-nos para nos assaltar, um roubo programado, não sei», afirma, agora, J. «Como era mulher, nunca pensei que fosse uma coisa sexual. Fui enganada por ela parecer culta, bem-falante e educada. Afinal, não passava de uma pessoa com problemas mentais», comenta Maria.

A verdade é que tudo não terá passado de uma bizarra partida com intenções sexuais. Maria e J. dizem que conhecem «pelo menos 20 ou 30 mulheres de Messines que caíram no logro», embora só quatro tenham apresentado queixa na GNR local. O modus operandi era sempre o mesmo: uma auto-intitulada doutora de uma clínica de Lisboa ou Faro telefonava para estabelecimentos comerciais onde não trabalhassem homens e repetia a lenga-lenga da mamografia gratuita por satélite.

As vítimas eram, então, convidadas a expor-se, nuas da cintura para cima, ou mesmo da cintura para baixo, em sítios visíveis – varandas, janelas ou mesmo na rua e entre carros estacionados. Contou, a rir, uma fonte policial que a burlona até conseguiu convencer uma mulher a arrancar dois pêlos púbicos e a passá-los pelos mamilos. Em algumas ocasiões, a intrujona telefonou uma última vez para confessar o número de orgasmos que tinha tido. Noutras, manteve o logro até ao fim. E há quem ainda esteja à espera que o resultado chegue pelo correio.

Isto é crime?

Também há quem garanta que o satélite já rodou por outras bandas – algumas vítimas asseguram que conhecem gente contactada em S. Marcos da Serra, Armação de Pêra e Tunes, mas que tiveram vergonha de divulgar ou formalizar queixas. Até uma mulher de Loures já veio dizer aos media que foi levada pelo mesmo engodo, há um ano. O que coincide com as suspeitas de Maria. «Sei que os telefonemas, por aqui, começaram há pouco menos de um ano, e o sotaque da senhora é de Lisboa. Eu até tenho as minhas desconfianças...», conclui, misteriosa.

As queixas já foram encaminhadas para o Ministério Público, mas a grande questão, agora, é saber em que crime incorreu a dita «doutora». Um magistrado contactado pela VISÃO diz ter muitas dúvidas de que a lei preveja este tipo de coisas. «As pessoas têm o direito de se queixar. Mas este caso, quando muito, poderá ser considerado devassa da vida privada.» O primeiro ponto a que se refere o magistrado, o artigo 192.º do Código Penal, diz que quem «observar ou escutar às ocultas pessoas que se encontrem em lugar privado (...) é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 240 dias». A dificuldade, aqui, é que as queixosas não se encontravam em «lugar privado», mas sim no meio da rua.

Porém, Maria nem sequer está especialmente interessada na condenação da burlona, ou mesmo numa possível indemnização. A sua preocupação, declara, é «alertar outras mulheres para que não caiam» como ela caiu. J., a seu lado, aproveita para apontar o dedo a quem se calou. «Houve muita, muita gente que andou por aí a despir-se e se acobardou. Eu, pelo menos, assumo a minha figura triste», protesta, a esbracejar.

Fonte: http://visaoonline.clix.pt/

Isto ficou maior do que eu estava à espera.

Li isto pela primeira vez na pag.206 do 11F (o meu livro de Fisica).

É sencasional!!!

"A computer program it's a world, the programmer its God"

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